quarta-feira, 16 de junho de 2010

A seguir, entrevista que a Comissão Popular para a Nova Universidade* realizou com o Prof. Dr. Ariovaldo Umbelino, geógrafo da USP, na qual ele se posiciona sobre a proposta da Reitoria da UFOPA de "unificar" os cursos de Geografia e História num único curso de graduação, medida que será aplicada também aos cursos de Filosofia/Sociologia, Matemática/Física e Química/Biologia.

COMISSÃO POPULAR: Prof. Ariovaldo, a nova universidade que vai ser instalada aqui na região, com sede em Santarém, terá o Curso de Geografia e História como Graduação. Então, o graduando vai ser formado em Geografia e História. O senhor como Geógrafo como analisa essa situação?

PROF. ARIOVALDO UMBELINO: Olha, na realidade, se isso acontecer aqui é lamentável, primeiro porque essa experiência durante os governos militares já foi tentada e se chamava “Estudos Sociais”. Essa experiência de Estudos Sociais começou a ser implantada na década de 30 nos Estados Unidos e em 1950 os Estados Unidos abandonou essa formação conjunta de História e Geografia. Então, na realidade, não será formado nem o Historiador e nem o Geógrafo; vai ser formada uma pessoa com um monte de conhecimentos que na realidade não correspondem ao estudo da Ciência.

Se aqui o que vai ser constituído é uma universidade pública, vocês não podem permitir em hipótese alguma que isso ocorra, porque não existe no Brasil inteiro nenhuma universidade com uma característica dessas. Então, é preciso olhar como os cursos nas outras universidades federais e nas universidades estaduais estão montados.

Cada Ciência, cada área do conhecimento tem a sua história, tem a sua trajetória, têm as suas correntes de pensamento que precisam ser explicitadas e trabalhadas de forma que vocês possam receber o conhecimento completo a respeito daquela disciplina. Não é?! É a mesma coisa que pegarem vocês e colocarem no rio, com o pé em cada canoa, mais cedo ou mais tarde as canoas vão se abrindo e vocês vão pra dentro d’água e vão morrer afogados. O que quer dizer o seguinte: que na realidade vocês não serão formados em nada, se isso acontecer aqui. Não é?!

Estão passando pra vocês um diploma de analfabetos, de analfabetos que fizeram um curso universitário. Um Curso de Geografia, pra falar especificamente da área que eu tenho trabalhado, ele tem que começar com a discussão de suas bases filosóficas.
(...)
Um Curso de Geografia, do ponto de vista da sua estrutura curricular, precisa começar com as bases do pensamento científico, não é? Ele tem que ter disciplina voltada para a questão relativa às correntes da filosofia... O curso tem que ter um pouco da história do pensamento geográfico, ou seja, como os geógrafos estudaram o mundo, desde que a Geografia existe como ciência, não é?!... Tem que ter um curso que deva discutir método de investigação que, via de regra, se faz uma confusão entre método e técnica de pesquisa, não é?!... Fazem uma amostragem estatística, fazem uma aplicação de questionário isso é técnica, técnica de pesquisa, isso não é método.
(...)
Na universidade já é difícil, tendo-se um curso só voltado pra uma área do conhecimento, você conseguir dominar aquela área... Agora, ser formado em mais de uma é evidente: você não vai ser formado em nenhuma.

A história já mostrou isso e o próprio MEC acabou com os estudos de Estudos Sociais. 0Quer dizer, não sei por que isso está sendo ressuscitado aqui.. Talvez pra deixar vocês paraenses um pouco mais ignorantes.. Quer dizer, eu levo uma universidade pública, mas não permito que lá se faça um debate sobre o que tem de mais avançado. Vocês têm a experiência da Universidade Federal do Pará, em Belém. Você não podem montar uma universidade aqui ignorando a própria universidade de vocês, que já tem um curso de Mestrado em Geografia e que não tem, evidentemente, lá uma formação que é de historiador e de geógrafo.
(...)

COMISSÃO POPULAR: Professor, as universidades, via de regra, têm suas especificidades nos locais onde elas são sediadas. Enquanto Ciência elas são idênticas, porque elas estudam a mesma Ciência. Uma nova universidade aqui na Amazônia poderá ter um outro rosto pelas suas especificidades, levando em conta os seus cenários: tem o cenário das populações tradicionais e tem o cenário das grandes empresas que aqui estão instaladas. Para o senhor qual deve ser a nova face de uma nova universidade aqui na região?

PROF. ARIOVALDO UMBELINO: Eu sempre vou defender (porque faço parte de uma corrente crítica na Geografia) que a universidade forme pensadores críticos que estudem tanto a Amazônia das populações tradicionais, a Amazônia dos povos indígenas, a Amazônia dos camponeses sem-terra que pra cá migraram na perspectiva de que aqui poderiam encontrar um pedaço de terra, onde pudessem viver com as suas famílias... Temos que também estudar esses projetos que o capital tem pra Amazônia, pra saber se é isso que as populações querem. E aí, não é só as populações da Amazônia, nós temos que discutir isso no Brasil inteiro.

É isso que o Brasil quer? É isso que a sociedade brasileira quer pro futuro? E nós temos que dar um basta nessa coisa da mídia. Não é a mídia que tem que dizer o que nós queremos! A mídia deveria transmitir aquilo que a população pensa, não é? A mídia hoje no Brasil presta um desserviço; ela, exatamente, acaba induzindo às vezes a população a caminhos que não são os caminhos que vão permitir que a população se reproduza. Então, uma universidade pra ela ter futuro, ela tem que desenvolver um pensamento crítico.

Nenhuma universidade fundada no Brasil que não aderir ao espírito crítico tem futuro. Há várias universidades que foram importantes no Brasil, no passado, que hoje não tem expressão nenhuma. Vão desaparecer como universidade, como centro de pesquisa, como centro de pensamento. Então, quais são as universidades que estão sobrevivendo? São as universidades onde reina o espírito crítico e o debate, o debate das idéias. A universidade é o lugar, por excelência do combate das idéias, e não da imposição de uma idéia sobre a outra, como às vezes até no processo de criação das universidades já vem embutido.

Então, se aqui for importante pra sociedade, pra sociedade como um todo, ter um curso que discuta o agronegócio, não vejo problema nenhum de que os cursos de Agronomia discutam o agronegócio, que os cursos de Geografia discutam o agronegócio, que os cursos de Ciência Política discutam o agronegócio, que o curso de Antropologia discuta o agronegócio. Agora, o absurdo é criar o Curso de Agronegócio, porque isso não é ciência. Ciência é Geografia, História, Sociologia, é a Política, então uma universidade tem que ser o centro da ciência e não dos instrumentos de administração do capital.

Então, o que nós temos que pôr sempre no centro é de que ciência não é a operacionalização de uma área do conhecimento que essa ciência trabalha; isso não é ciência, isso é técnica. Então o Curso de Agronegócio é um curso que vai ensinar as técnicas e que evidentemente são estudadas pelas diferentes ciências. Então, a universidade deve ter seu centro nas chamadas ciências-mães e na nossa mãe de todas que é a Filosofia. Então, uma universidade que quiser se construir como um centro na produção do conhecimento científico precisa ter um curso de Filosofia e tem que ter as ciências-mães. Quais são as ciências-mães?

Começando pelas Ciências Humanas: a Geografia, a História (separadamente), a Sociologia, a Antropologia, a Ciência Política, a Economia e a Educação (Pedagogia)... A Psicologia se quiserem, que é uma ciência de interface. Essas são as ciências-mães. Ou seja, sem isso aqui não há universidade. Depois você tem as Ciências Exatas, a Matemática, a Física, a Química e a Biologia. Fora daí é tudo técnica, é tudo operacionalização; não é ciência. Foi assim que nasceu a Universidade de São Paulo, a primeira universidade do Brasil: ela nasceu com a criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, que são as ciências-mães. Evidente que eu não estou com isso dizendo que a universidade deva ter só isso, a universidade pode ter as Letras, tem que ter as Artes... Mas seu cerne devem ser as ciências-mães.

* A Comissão Popular para a Nova Universidade é formada pelas seguintes organizações: DCE/UFOPA, UES, FDA, Pastoral Social, CADED, CABIO, SINPROSAN, SINTEPP, AMDS, AMBL, FAMCOS, Rádio Rural.

Veja a entrevista na íntegra no blog dos estudantes da UFOPA: http://estudanteufopa.blogspot.com/

Um comentário:

  1. faltou postar data de nscimento, lugar que nasceu. nome do pais. qdo começo sua targetoria

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