segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Por Tatianne Picanço Rabêlo*
Na última terça feira (10.01.2012) foi divulgada nos meios de comunicação de Santarém a lamentável notícia de que uma família foi assaltada. O acusado estuprou uma das vítimas, uma menina de apenas 12 anos de idade dentro da própria casa e na frente dos familiares.
Infelizmente esse não é um caso isolado de violência sexual contra crianças, pelo contrário, é muito mais comum do que a maioria das pessoas possa imaginar. Dados do Conselho Tutelar de 2009 mostram que no Oeste do Pará estão os maiores índices de abuso sexual contra crianças.

Em Santarém, os números têm aumentado a cada ano; somente entre os meses de Janeiro e Abril de 2011 os registros de casos de violência e exploração sexual contra crianças e adolescentes foram de 17 casos, dos quais dois foram de exploração sexual. Ao final do ano de 2011 os relatórios do Conselho Tutelar de Santarém apontam um total de 49 casos de estupro contra 18 casos do ano anterior, ou seja, percebe-se que os números triplicaram. Desse total de estupros a maioria são contra meninas, 40 meninas e 9 meninos, exatamente, a grande maioria de meninas!
Não devemos nos iludir pensando que isso é meramente fruto do acaso, não! O fato é que nós mulheres sofremos historicamente todo o tipo de violência que se possa imaginar e quando se fala de mulheres pobres e negras a situação piora consideravelmente.
Além dos altos índices de estupros, a mercantilização de nossos corpos, a partir do tráfico de mulheres pelo mundo contabiliza a terceira maior rede de tráfico do planeta, perdendo apenas para armas e drogas. No Brasil, os índices de violência contra mulheres são alarmantes: segundo o Mapa da Violência 2010, realizado pelo Instituto Sangari, uma mulher é assassinada a cada duas horas no Brasil, o que faz do país o 12° no ranking mundial de assassinatos de mulheres. 40% dessas mulheres têm entre 18 e 30 anos. A maioria das vítimas é morta por parentes, maridos, namorados, ex-companheiros ou homens que foram rejeitados por elas.
Em dez anos (de 1997 a 2007), 41.532 meninas e adultas foram assassinadas, segundo o Mapa da Violência 2010, estudo dos homicídios feito com base nos dados do SUS. A média brasileira é de 3,9 mortes por 100 mil habitantes; e o estado mais violento para as mulheres é o Espírito Santo, com um índice de 10,3 mortes. No Rio, o 8 mais violento, a taxa é de 5,1 mortes. Em São Paulo a taxa é de 2,8.
Dados do Disque-Denúncia, do Governo Federal, mostram que a violência ocorre na frente dos filhos: 68% assistem às agressões e 15% sofrem violência física com as mães. A violência contra a mulher é a maior preocupação para 56% das mulheres entrevistadas pela pesquisa realizada por IBOPE e Instituto Avon em 2009. A mesma pesquisa aponta que 55% dos entrevistados conhecem pelo menos um caso de violência doméstica.
Segundo pesquisa realizada pela Subsecretaria de Pesquisa e Opinião Pública do Senado Federal em 2005, 40% das entrevistadas declararam já ter presenciado algum ato de violência contra mulheres e 17% afirmaram já ter sofrido violência, sendo que dessas, 55% sofreram violência física, 24% violência psicológica, 14% violência moral e 7% violência sexual.
Entre as mulheres agredidas, 71% foram vítimas mais de uma vez e 50% quatro vezes ou mais, segundo a mesma pesquisa. O marido ou companheiro é responsável por 65% das agressões.
Entre os homens, um em cada dez (10%) diz espontaneamente ter sofrido violência de alguma mulher (excluída a mãe). E diante de 11 modalidades de violência citadas, quase a metade (44%) já teria sofrido alguma, sobretudo algum tipo de controle ou cerceamento (35%), mas também alguma ameaça ou violência física (21%), com destaque para os que levaram tapas e apertões (14%).
Então, pelo que podemos perceber, 10% de homens revelam já ter sofrido violência por parte de uma mulher, em contrapartida a cada 2 horas uma mulher é assassinada por um homem. Vamos fazer uma reflexão sobre isso, principalmente os que dizem que a Lei Maria da Penha não tem razão de existir, pois os números estão aí pra comprovar que é sim necessária uma política específica de não violência contra mulheres.
A Lei Maria da Penha (Lei 13.340/2006) representa uma conquista importante, porém, praticamente não saiu do papel, pois os cortes no orçamento federal sempre são em cima de programas sociais, a Secretaria Especial de Políticas para Mulheres, por exemplo, executou menos de 10% do parco recurso destinado ao combate à violência, a Lei nem sempre garante a proteção à mulher e punição ao agressor. No Brasil são cerca de 400 delegacias da mulher para mais de 5 mil municípios e os abrigos para mulheres vítimas de violência não passam de 80.
Do ponto de vista da violência moral ou psicológica, as debilidades da lei são ainda maiores, pois a assistência é completamente precária. Nos casos de Santarém o Conselho Tutelar afirma que para combater os crimes contam com um serviço de disque denúncia e com o apoio das policias, nada mais. Portanto, é imprescindível que a Lei seja integralmente aplicada, para isso é preciso a ampliação e instrumentalização das delegacias, maior fiscalização, novos abrigos, criação de campanhas contra a violência à mulher. Além disso, políticas públicas visando à geração de emprego e formação para ingresso no mercado de trabalho são fundamentais a essas mulheres.
Não podemos tolerar que casos como esse da menina de Santarém e tantos outros pelo Brasil e pelo mundo continuem acontecendo e que não tenhamos tratamento adequado para as vítimas, por isso, é necessário nos organizamos, só a luta e a organização será capaz de mudar essa realidade. Nós do Coletivo de Mulheres Rosas de Liberdade acreditamos que só por meio de uma maior participação das mulheres nos espaços organizados no mundo do trabalho e da política que será possível uma mudança significativa a atual relação entre homens e mulheres.
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*Tatianne Picanço Rabêlo é integrante do Coletivo de Mulheres Rosas de Liberdade.

# Informações extraídas da Revista Feminista Socialismo e Liberdade, ano III, n° 9 e dos sites da Fundação Perseu AbramoFundação Lauro Campos.

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