segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Por Felipe Bandeira[i]





1968 entrou para a história como o ano das revoluções. Os protestos irromperam na França, onde centenas de estudantes ocuparam a Universidade de Nanterre. As barricadas de París, logo abriram caminhos para as contestações na Europa e em várias regiões do Mundo. Na América Latina se fortaleceram as lutas contra as ditaduras e o subdesenvolvimento, no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, ocorreu a passeata dos Cem Mil, reunindo amplos segmentos de contestação ao regime militar. Período de efervescência, concentrou em um mês, o que os países não concentraram em uma década.


Com o fim da 2° Guerra mundial em 1945, EUA e URSS mergulharam o mundo no clima nebuloso da guerra fria. Como símbolo dos novos tempos, ergue-se na noite de 1961 o muro da vergonha, dividindo a Alemanha em Oriental, comunista e Ocidental, capitalista. Tempos difíceis, usurparam a crítica e solaparam os que discordavam uma vírgula do discurso oficial.


A década de 50 e 60 foi para o capitalismo um período de intensa acumulação, sobretudo, para os EUA, que saiu fortalecido com o fim da guerra. A URSS também cresceu exponencialmente, baseando-se, sobretudo, no fortalecimento da indústria de guerra. Os dois blocos rivalizavam em pé de igualdade.


O maio de 68 foi uma resposta política para a situação mundial. Os manifestos emergiram como um movimento de contra-cultura, criticando valores de consumo, machismo, racismo, liberdade de expressão, liberdade sexual, liberdades políticas. Em uma de suas pichações diziam que a ação não deve ser uma reação, senão uma criação!


Ocorreram manifestações e greves por toda a Europa. Na Espanha, Alemanha Ocidental e Bélgica, universidades foram ocupadas e estudantes entraram em confronto com a polícia. Na Itália, cerca de 3.000 estudantes ocuparam a sede do jornal "Corriere della Serra", posteriormente, cerca de 1 milhão de trabalhadores entram em greve. A onda de greves foi fundamental para o fortalecimento das manifestações.


Na Tchecoslováquia, com tentativa de contrapor o comunismo burocrático da URSS, insurge a primavera de Praga. Com um forte programa de reformas, Alexander Dubcek, eleito para o governo em janeiro de 1968, propunha mais autonomia, liberdade de expressão e a ampliação das liberdades polítcas, possibilitando, inclusive a criação de partidos. As medidas foram de encontro aos interesses da burocracia stanilista, e em 20 de agosto de 1968 as tropas da União Soviética e do Pacto de Varsóvia invadiram e ocuparam a Tchecoslováquia. A população reagiu com protestos, bloquearam as ruas com barricadas. Com a forte repressão, a Primavera de Praga definhou. A linha dura do partido comunista se fortaleceu e Gustáv Husák substituiu Dubcek em 17 de abril de 1969.


Na América Latina, o ano de 1968 foi marcado por intensas mobilizações. Na Argentina surgiram o Rosariazo e o Cordobazo contra a ditadura, no Chile, Allende representava um salto nas forças da esquerda. No Brasil ocorreram várias mobilizações, marchas, embates contra a ditadura. Nesse período, cerca de 1200 estudantes foram presos em Ibiúna-SP, quando ocorria na clandestinamente o 30° Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE).


Muitos especialistas e militantes da esquerda dizem que estamos em um novo 68. A força das ruas novamente protagoniza mudanças fundamentais na sociedade. As jornadas de junho no Brasil de 2013 mostraram o fio de continuidade na história dos indignados. Cabe a nossa geração o legado das transformações!


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[i] Coordenador Geral da UES, estudante de ciências econômicas UFOPA e militante do Juntos! Juventude em Luta!

sábado, 28 de setembro de 2013

Por Carlos Bandeira Jr.*


Há dez anos que diariamente, por volta de 18hrs, Osvaldo, conhecido como Baruca, senhor de 64 anos, monta sua banca de churrasquinhos em cima do meio fio da avenida Rui Barbosa. Por lá permanece até a meia noite quando termina sua jornada. 



Sobre a mesa expõe os alimentos. Há uma bandeja com churrascos de calabresa e outra para os de carne e mistos. Tem os molhos de pimenta e as vasilhas com farinha, o complemento do churrasco. Seu Baruca vende os espetos de carne no preço de dois reais e os de calabresa a dois cinqüenta ou três por cinco.


A primeira vista o ponto do seu Baruca parece meio isolado, fica debaixo de uma das muitas mangueiras daquela avenida. O local é bastante escuro e pouco movimentado naquela hora. Ele atua de modo diferente dos outros vendedores que dizem sempre montar suas barracas onde há movimento.






Da sua rotina de ambulante, entre assar um espeto e outro, seu Baruca conversa, sorrir, passa troco, manteiga, virava a carne... Identifiquei-me dizendo ser aluno da Ufopa e estar fazendo pesquisa com trabalhadores ambulantes e se ele não poderia conversar um instante comigo. Respondeu estar bastante ocupado, mas para eu ir perguntado que ele iria responder.


O questionei se ele era de Santarém ou de outro lugar. Falou ser daqui mesmo, mas que quando jovem foi para Manaus e lá viveu trinta anos. Já fazem dez anos que retornou a Santarém. Em Manaus constituiu família, teve várias esposas e filhos. Disse contando tudo tem 21 filhos, fora uma que morreu. Lá trabalhava como camelô, sempre por conta. 





Com relação a escolaridade Baruca disse que estudou no Dom Amando, completou o ginásio, mas como o pai era carroceiro não teve mais condição de pagar seus estudos e ele parou. Ajudava o pai no trabalho. Foi nessa época que viajou para Manaus.


Ao retornar a Santarém não conseguiu emprego porque já era velho, então como sempre trabalhou como autônomo decidiu vender alguma coisa na rua. Foi quando montou sua banca, desde daí trabalha nesse ponto. Disse saber se virar para ganhar dinheiro. "Dou um jeito. Jogo bilhar, baralho, dominó, eu me esforço”.



Durante o tempo de trabalho no local apenas uma vez a prefeitura tentou retirá-lo de lá. Mas tudo já foi resolvido, conversou com um vereador e liberou para que permanecesse trabalhando no espaço. “Mas olha, eu deixo tudo limpinho, organizo tudo pra não ter problema.”



Hoje, Baruca mora só, teve esposa por aqui mas já separou. Mencionou ter seis filhos em Santarém que dependem da sua renda. Com relação a pensão disse que nunca pagou porque ele separou das mulheres e não dos filhos. Falou que gosta de tomar sua “geleda” e ir atrás das mulheres ainda.



Nesse tempo que permaneci na sua venda percebi como Baruca é conhecido. Vieram várias pessoas para comer o churrasquinho. Na rua passaram uns dois senhores que gritando “ei Baruca”, dando a entender que já o conheciam. Baruca disse que seus clientes são principalmente estudantes, mototaxistas, taxistas, mas tem muitas outras pessoas que vão comprar com ele.



Com relação ao apelido, citou ser herança de seu pai do tempo que jogou no time do São Francisco. Quando entrou para também jogar no clube, nas décadas de 60 e 70, recebeu o mesmo apelido do pai. Desde então todos o conhecem assim: Baruca.


* Fotógrafo e Acadêmico de Antropologia UFOPA.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Por Raiana Siqueira* 



No dia 5 de junho, foi aprovado pela Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 478/07, titulado como Estatuto do Nascituro. Trata-se de um projeto que traz uma enorme ameaça aos direitos civis e direitos das mulheres.


Este projeto basicamente criminaliza a mulher que aborta e banaliza a sua vida tornando um embrião muito mais importante que a própria mãe. Neste caso, um “conjunto de células” passa a ser digno de todos os direitos jurídicos possíveis, isto é, se uma mulher estiver grávida e com câncer, por exemplo, os médicos de forma alguma poderão tentar curá-la, uma vez que o embrião seria afetado pela quimioterapia e com este projeto a mulher jamais poderá abortar, ou seja, dane-se a mãe!


O Estatuto do Nascituro é um grande absurdo e retrocesso, fere os direitos das mulheres conquistados através de muitos anos lutas e tira a autonomia da mesma sobre o seu próprio corpo. Mas não pense que acabou, dentre os absurdos propostos por este projeto, temos também o Art. 13, que diz o seguinte: “o nascituro concebido em um ato de violência sexual não sofrerá qualquer discriminação ou restrição de direitos...”, isto é, o Estado quer criminalizar o aborto, tornando-o um crime hediondo e obriga a mulher a carregar o fruto de uma violência. Além disso, caso identifiquem o estuprador, ele terá que pagar a pensão, dando a ele direitos de paternidade – inclusive, por exemplo, a possibilidade de ter a guarda da criança. Caso não o encontrem (e se a mãe não tiver condições), o Estado garantirá um auxílio financeiro até os 18 anos da criança, o chamado “Bolsa estupro”. Um total desrespeito.


O projeto proíbe também qualquer comentário que faça apologia ao aborto, prevendo pena de seis meses a um ano e multa. Desta forma, coloca em jogo a nossa liberdade de expressão.


No entanto, nós da UES entendemos que não cabe ao Estado tomar decisões pela mulher acerca do seu próprio corpo. As decisões cabem única e exclusivamente à mulher, e como disse a cantora Tulipa Ruiz: “Meu Corpo, minhas decisões”, portanto, repudiamos por completo este projeto de lei e dizemos:
#NÃOaoEstatutodoNascituro.


* Diretora de Esporte (UES); Militante do Juntos! Juntas!; Membra do Coletivo Feminista Rosas de Liberdade e Acadêmica do curso de Educação Física no CEULS/ULBRA.

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Por Felipe Bandeira[i]








O agronegócio na Amazônia contrasta atividades altamente capitalizadas com atividades tradicionais. Durante a ditadura militar – e há os que dizem que a ditadura não existiu por aqui! – a região foi apropriada por grandes investimentos que alavancariam de vez o desenvolvimento da região. Dito isto, rasgaram a floresta com estradas, implantaram a colonização dirigida ao longo das BR’s, criaram grandes pólos de extração mineral, construíram hidrelétricas, incentivaram o latifúndio, a criação extensiva de gado, enfim, rifaram a Amazônia inteira ao capital internacional.


De lá pra cá, a política econômica seguiu o mesmo beabá. O avanço da fronteira agrícola para Amazônia trás consigo uma lógica de apropriação do território eminentemente comercial. O Brasil é medalha de prata em exportações de grãos, sobretudo, com a soja, perdendo apenas para os EUA.


Em que o Brasil é ouro mesmo, são nos vergonhosos números de trabalho escravo, de morte no campo, de famintos, de exploração do trabalho infantil e de concentração de renda. A Vale, por exemplo, retira nosso minério, enraíza a miséria nas regiões de exploração e remete todos os lucros para fora, o mesmo faz a Cargill, ALCOA, MRN e tantas outras.


Com o avanço da soja, a especulação fundiária e imobiliária vão a mil. A expulsão de trabalhadores do campo engordam os bolsões de miséria nas periferias da cidade. Bairros são formados sem a mínima infraestrutura. Esse crescimento desordenado das cidades adjacentes produz violência, prostituição – inclusive de crianças - e a criminalização cada vez crescente do pobre. Ainda assim, a soja vem se expandindo num ritmo acelerado.


Para se ter idéia, aqui na Amazônia a produção é comprada antes mesmo de se plantarem as sementes! Para garantir a segurança do investimento, os sojeiros não economizam no uso de pesticidas. Somos o país que mais consome agrotóxicos do mundo!


Nesse ranking desavergonheto o que fica é a estranha sensação da vivermos no período colonial. Escravos, latifúndio e metrópole. Falta alguma coisa?


[i] Coordenador Geral da UES, estudante de Ciências Econômicas UFOPA e militante do Juntos!
Por Felipe Bandeira[i]

Os EUA vangloriam-se por sua democracia consolidada. Só não dizem que as guerras foram seus verdadeiros propulsores econômicos. Ah vá!

Em uma economia capitalista, as decisões da produção baseiam-se, antes de tudo, no princípio dos lucros do que das necessidades humanas. Ou seja, eu desenvolvo uma agricultura cada vez mais eficiente não por que o Brasil tem mais de 10 milhões de famintos, mas sim por que as grandes empresas precisam cada vez mais de lucros crescentes.

A prova dos nove foi o crack na bolsa de Nova York em 1929. Com os títulos da bolsa despencando ladeira abaixo, os empresários decidiram fazer um corte drástico nos investimentos e na produção. Resultado: desemprego, fome, austeridade. Os que mais sentiram os impactos da crise, logicamente não foram os fanfarrões do capital financeiro. Para se ter idéia, entre os desempregados, mais de 60% eram negros.

O sistema capitalista parecia estar a beira de um colapso total. Em compensação a União Soviética passava por um crescente ritmo de crescimento econômico. Para os capitalistas era preciso urgente rever todos os seus conceitos e reavaliar seus erros.

Nesse período surge a teoria do Welfare States, o Estado do Bem estar social. Para que se continuasse acumulando, o Estado necessitava pensar em projetos e políticas para empregar a massa ociosa, diminuir o número de desempregados, aumentando desta forma a renda disponível da população. Mais renda significa mais consumo, que significa mais investimento por parte da produção, que significa mais acumulação. Pronto! Capitalistas do mundo inteiro, seus problemas acabaram!

Para isso, os investimentos do Estado não deveriam implicar num aumento de capital, pois no período da crise, tinha-se um monte de produtos empoeirados nos estoque, pra quê investir em mais capacidade produtiva? A solução, proposta por Keynes foi investir nas construções de escolas, hospitais, estradas, creches, enfim, questões sociais para onerar cada vez menos a renda dos trabalhadores, sobrando desta forma, mais verdinhas pra gastar no Mcdonalds.

No entanto, a massa dos investimentos foi na economia bélica. Com a 2º Guerra mundial estava resolvido o desemprego crescente, na verdade, o problema agora é a falta de mão-de-obra. Em 1940, as despesas de caráter militar totalizavam 3,2 bilhões de dólares, ou, 3,2% do PNB (Produto Nacional Bruto). Em 1943, no auge da segunda guerra, as despesas militares devoraram quase 40% do PNB. Eram 14 milhões de pessoas que precisavam ser armadas, 296.000 aviões, 5.400 navios cargueiros, 64.500 barcaças de desembarque, 86.000 tanques e 2.500.000 caminhões, produzidos somente nos EUA.

A Guerra deixou claro como as despesas governamentais de caráter militar poderiam estancar a hemorragia financeira, utilizando o sangue da humanidade que morreu nas trincheiras, nos porões dos navios, nos campos de concentração, e de quebra, assegurar altos retornos para o capital.

Hoje, os EUA se utilizam do guarda chuva do terrorismo pra justificar inúmeras atrocidades. Invadiram o Iraque, Afeganistão e alegam que os árabes são terroristas radicais. Na Síria, já somam mais de 100 mil mortos nos conflitos para derrubar a ditadura imperialista de Bashar AL Assad. Na Palestina, há um massacre do povo Árabe, que diariamente são humilhados e assassinados pelo Estado repressor de Israel. José Saramago, escreveu certa vez que Israel (e o mundo) ainda tem muito que aprender se não entendem os verdadeiros motivos que levam um homem a se transformar numa bomba.

Os EUA é o país que mantêm o maior número de presos políticos. Em Guantánamo, nem mesmo o direito de defesa os presos possuem. Hoje, existem mais negros na prisão do que escravos em 1850.

EUA é democrático? Façam-me o favor!

[i] Coordenador Geral da UES, estudantes de Ciências Econômicas UFOPA e militante do Juntos! Juventude em Luta.

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Bolsonaro é uma quinquilharia política do Brasil. Canalha, afirmou que “o grande erro foi ter torturado e não matado”. Com essa frase fica claro que a crise política e econômica do país canarinho também gorjeia como lá!


As jornadas de junho mostraram que um Brasil diferente é possível. A crise da institucionalidade se agrava ainda mais, ao passo que se alargam os interesses promíscuos de partidos e elites econômicas. Jair Bolsonaro, um desses políticos com ideias - nas palavras do Sakamoto - cheirando a naftalina é um velho exemplo da total falta de representatividade parlamentar. Bolsonaro fez carreira durante a ditadura, alcançando cargos cada vez mais importantes a medida que o regime militar engrossava a repressão, torturava estudantes, jornalistas, estuprava mulheres e é claro, fuzilava os malditos comunistas.


Bolsonaro não está só, mostrando que até mesmo a estupidez tem capacidade de agregar! Na Europa são cada vez mais fortes movimentos de setores de extrema-direita que tentam impor um novo balanço histórico dos regimes fascistas de Mussolini e Hitler, tentando a todo custo mostrar que as atrocidades e genocídios foram um mal necessário.

Esses movimentos, apesar de minoria, dão sinais cada vez mais latentes do anacronismo do capitalismo.

A crônica do Sakamoto esclarece muita coisa. Nosso passado mal resolvido nos atormenta sempre! Boa leitura.





Entristece saber que Bolsonaro não está sozinho


Publicado no blog do Sakamoto


Bolsonaro é tosco? Sim, ele é. Mas não é burro. E nem está sozinho.

Representa uma camada da população que divide com ele a visão de mundo e tem orgasmos múltiplos ao ouvir as estripulias de seu deputado. Estripulias que não vêm de rompantes do fígado, mas são milimetricamente calculadas para ganhar espaço da mídia.

Todos os pontos de vista merecem ter voz em uma democracia. O problema é que a visão de mundo de Bolsonaro e representados torna o diálogo e mesmo a convivência pacífica impossíveis. Um estranho paradoxo: Bolsonaro e representados defendem a antítese da democracia, apesar de só continuarem podendo se expressar livremente por conta dela.

Na mais nova presepada, ele teria socado o estômago do senador Randolfe Rodrigues (PSol-AP), na manhã desta segunda (24), durante um bate-boca na entrada da Comissão da Verdade no 1o Batalhão de Polícia do Exército, onde funcionava o DOI-Codi, centro de torturas durante a Gloriosa. Bolsonaro admitiu tê-lo “empurrado por baixo” e, ao final, conseguiu entrar no quartel, mas não acompanhou a visita da comitiva para a qual não estava convidado.

“Se eu dou um soco nele, eu o desmonto. Boto ele no chão para dormir três dias”, marrento como Anderson Silva. O PSol deve entrar com – mais uma – representação contra o deputado carioca.

Vamos ao ponto: ele não é causa e sim consequência. Verbaliza a visão de uma parte da sociedade que reproduz processos que mantém a opressão, a dor e o preconceito. Ou seja, o que me angustia não é ele e um grupo de gente com ideias cheirando a naftalina, mas que parte do Brasil está com ele. Nas rodas de amigos em bares, mas mesas de jantar com a família, na hora do cafezinho no trabalho ou no silêncio do banheiro, lendo as notícias do dia no tablet. De todas as idades. De várias classes sociais.

Bolsonaro tinha 29 anos quando Figueiredo deixou o Planalto para cuidar de seus cavalos. Ficou 15 anos no Exército e mantinha-se na Câmara dos Deputados devido à sua defesa dos direitos trabalhistas dos militares (pela quantidade de rifles que desaparecem dos quartéis no Rio e reaparecem nas mão do tráfico, verifica-se como os salários são vergonhosamente baixos). Daí, foi se destacando na defesa de assuntos simbolicamente relevantes para os seus representados.

Bons exemplos disso não faltam. Foi ele quem colocou um cartaz na porta de seu gabinete na Câmara com os dizeres “Desaparecidos do Araguaia, quem procura osso é cachorro”, zombando das famílias de vítimas da Gloriosa e dos esforços do governo federal para encontrar as ossadas dos guerrilheiros mortos pela ditadura e enterradas em local que o Exército nega revelar.

Ou o machismo truculento presente na entrevista dada para a revista Isto é Gente, em 2000: “Meu primeiro relacionamento despencou depois que elegi a senhora Rogéria Bolsonaro vereadora, em 1992. Ela era uma dona-de-casa. Por minha causa, teve 7 mil votos na eleição. Acertamos um compromisso. Nas questões polêmicas, ela deveria ligar para o meu celular para decidir o voto dela. Mas começou a frequentar o plenário e passou a ser influenciada pelos outros vereadores. (…) Foi um compromisso. Eu a elegi. Ela tinha que seguir minhas ideias. Acho que sempre fui muito paciente e ela não soube respeitar o poder e liberdade que lhe dei”.

Note o “que lhe dei”.

Outra frase de efeito: “O grande erro foi ter torturado e não matado” – esta dita após seminário no Clube Militar, no Rio de Janeiro, em 2008, contra manifestantes do Grupo Tortura Nunca Mais e da União Nacional dos Estudantes. Segundo ele, essa teria sido a melhor solução para evitar que, hoje, pessoas perseguidas pela ditadura pedissem indenização ou reclamassem a justa e correta abertura dos arquivos que contam o que aconteceu na época.

(Menos “humano” que o seu colega de partido Paulo Maluf, que outrora sugeriu aos criminosos “estupre, mas não não mate”.)

Em um quadro de perguntas e respostas do programa CQC, veiculado há dois anos, compartilhou impressões sobre o mundo. Um filho que fuma maconha merece levar “porrada”. Ser um pai presente e dar boa educação garante que a prole não seja gay. E caso seus filhos se apaixonassem por uma negra, respondeu que eles eram educados e que não viveram em ambiente de promiscuidade, como a cantora Preta Gil, autora da pergunta. No dia seguinte, sua página trouxe uma justificativa: de que a pergunta foi “percebida, equivocadamente, como questionamento a eventual namoro de meu filho com um gay”. Ah, então tá.

É claro que Bolsonaro e alguns militares da reserva (com a ajuda de alguns “estrelados” da ativa) querem que a verdade e a Justiça permaneçam enterradas em cova desconhecida junto com assassinados pela ditadura. E, pelo que parece, que sejam enviados para as mesmas covas, os direitos conquistados a duras penas depois que a ditadura, que ele defende, caiu.

E tendo em vista os posicionamentos conservadores, machistas, homofóbicos, preconceituosos de grande parte da população brasileira e que são defendidos com unhas e dentes pelo nobre deputado e seu grupo, talvez você esteja do lado dele. E nem perceba.

Em tempo: aos leitores que se enquadram como cães de guarda do ranço da ditadura e que vão vir com pérolas como “se punir torturadores, tem que punir os terroristas”, recados: a) cresçam; b) livros de história são baratos; c) podem se esgoelar à vontade, não dou a mínima.

Fonte: http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2013/09/24/entristece-saber-que-bolsonaro-nao-esta-sozinho/

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Por Felipe Bandeira[i]






Em seu livro, O príncipe, Maquiavel afirma que todos os domínios que existiram e que imperaram sobre os homens são Estados e estes ou são repúblicas ou principados. Esta afirmação, apesar de sumária, representa o esforço das primeiras reflexões sobre os Estados modernos. Nos seus notáveis escritos, ao mesmo tempo em que há um rompimento com as reflexões hegemônicas fundadas na soberania divina do poder, inaugura-se uma moral diferente da moral cristã. Como dizia Gramsci, Maquiavel propõe uma moral específica à política dos Estados Modernos.


Suas reflexões resgatam a linha de pensamento inaugurada pelos historiadores clássicos como Tácito, Túcides e Tito Lívio. Rejeita a tradição idealista de Platão, cujo, o pensamento arquitetava sociedades que nunca existiram entre os homens, ao contrário, costumava dizer que considerava a realidade como ela é, e não como deveria ser, a sua “veritá effetuale”.


Nascido em Florença em 1469, Nicolau Maquiavel foi contemporâneo de uma Itália dividida em vários Estados, estes constituídos de regimes diferentes, desenvolvimento econômico variados, e, sobretudo, cercada de intensos conflitos e sujeitos a constantes invasões dos países estrangeiros. As vicissitudes de seu tempo mostram uma Itália em crise, prestes a perder sua independência desde a invasão francesa em 1494. Nestas circunstâncias, Nicolau reflete sobre o que fazer e quais as saídas possíveis para consolidar uma nação forte.



Para além da sua simpatia pela república e a democracia, Maquiavel vê a necessidade de um governo forte e centralizado, capaz de arrancar a Itália do seu estado de subordinação. Frente a essa situação, observou que na Itália é grande a virtù dos membros, se não lhe falta a cabeça. Por isso, a necessidade do Estado autônomo, sem subordinação as ordens divinas, unitário, que deveria ser constituído através da iniciativa do príncipe. A Itália, afirma Maquiavel, vê-se toda pronta e disposta a seguir uma bandeira, desde que exista alguém que a levante (...). O que não se fará muito difícil, caso se estude antes as ações e as vidas denominadas nesse discurso. Desta forma, em sua obra dá-se o caminho para se construir o Estado moderno.


Um aspecto importe de O Príncipe, é que este não pode ser considerado como uma simples abstração, apesar de quando escrito não compunha a realidade histórica. A rigidez metodológica e o rigor científico de abstração revelam o caráter histórico dos processos políticos. O príncipe é justamente a força capaz de se impor aos caos existente.


Outro aspecto importante, como destacou Gramsci em suas notas sobre Maquiavel, é de O Príncipe não ser um tratado sistemático, mais um livro “vivo”, no qual ideologia política e ciência política fundem-se na forma dramática do mito [1]. Gramsci faz em sua análise o recorte sistemático sobre a construção do mito e da vontade coletiva.



Nascido na Sardenha, Gramsci foi um grande dirigente marxista. Eleito Deputado pelo PCI em 1924, combateu ferrenhamente o facismo de Mussolini. Foi preso em 1925, onde permaneceu trancafiado até 1937, quando morre. Nos anos em que permaneceu aprisionado escreveu sua obra intitulada Cadernos do Cárcere.


O moderno príncipe, afirma Gramsci, não pode ser uma pessoa real, um indivíduo concreto, só pode ser um organismo, um elemento complexo da sociedade no qual já tenha tido início a concretização da vontade coletiva reconhecida e afirmada parcialmente na ação. E continua, este organismo já esta dado pelo desenvolvimento histórico e é o partido político.


Obviamente que na Itália seiscentista de Maquiavel esse processo se dava em estruturas específicas, diferente da Itália do século XX de Gramsci, tomado por forças fascistas. O fio de continuidade da teoria gramsciana, no entanto, é justamente a necessidade da direção, da hegemonia política. Nisto, Gramsci apresenta um avanço dialético na teoria marxista.


Com Marx e Engels se afirma o caráter de classe do Estado. Esse caráter é fruto da base econômica que reproduz uma sociedade fragmentada: de um lado os donos de capitais e dos meios de produção, e do outro, trabalhadores sem nenhum tipo de propriedade. Esta descoberta mostrou que a aparente superioridade do Estado encontra fundamento no processo histórico da sociedade de classes, e não de sua autoridade em si mesmo, como afirmava Hegel. Neste aspecto, o Estado cumpriria o papel de mantenedor da ordem burguesa, utilizando de sua força para controlar e reprimir os levantes dos trabalhadores.


Em Luta de Classes na França, Marx mostra como os antagonismos de classes necessitavam amadurecer, tendo para isso que abandonar seus apêndices pré-revolucionários. O avanço para a classe trabalhadora representava a capacidade de organização e de se lançar efetivamente para o processo e mudança revolucionária. Numa palavra, afirma Marx, o progresso revolucionário abriu caminhos não pelas suas conquistas tragicômicas imediatas, mas inversamente, por ter criado uma poderosa e coesa contra-revolução.



Gramsci, ao atualizar as mudança políticas e estruturais, percebeu que a burguesia e o Estado capitalista impunha uma forma bastante complexa e resistente de dominação, por isso pensou a estratégia revolucionária para o ocidente. Basta pensar, por exemplo, que no período acima descrito por Marx, ainda não se tinha experiência dos grandes sindicatos e dos partidos operários de massas, isso se tornou um elemento importante na análise do Gramsci. Por isso, enfatiza a importância da hegemonia, de marcação de posições estratégicas para a luta dos trabalhadores, dentro e fora da institucionalidade, - como dizem, no fio da navalha - sem abandonar, é claro a base de análise marxista.



A atualidade de Maquiavel e Gramsci evidencia um debate fundamental para os novos tempos. A crise econômica provocou uma cisão no capitalismo. Desde 2011 com o rebentar da primavera árabe e dos protestos em massas, a população toma as ruas e coloca em xeque o estatuto da dominação. Em tempos de crise é preciso teoria! Não sem razão que o “maquiavelismo” hoje encerra uma infinidade de interpretação e ambigüidades, bem como o pensamento de Gramsci também vem sendo utilizado desde setores reformistas até a direita liberal. Essas infinidades de interpretações - muitas pretendem sacralizar e justificar interesses pessoais - mostram a necessidade de leitura desses autores, que antes de tudo, foram grandes sujeitos que impuseram uma forte fissura em seus tempos. Em Maquiavel a força da palavra, em Gramsci a força do exemplo!




[1] (Cadernos do Cárcere, p. 13).


[i] Coordenador Geral da UES, estudantes de Ciências Econômicas na UFOPA e militante do coletivo de juventude Juntos! Juventude em Luta!

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Por Felipe Bandeira*

O rebento das revoluções árabes varreu do mapa ditaduras e mostrou que a indignação da juventude e dos oprimidos pode mudar o mundo em que vivemos. As ruas e as praças tornaram-se símbolos do poder popular. No Egito, a praça Tahir inaugurou a era dos Indignados!
A primavera Árabe representa o mais poderoso foco de resistência contra o imperialismo. Já em 2011 o fardo da crise econômica se alastrou com a rapidez de uma fagulha em meio a um barril de pólvoras. O Oriente Médio logo se mostrou o elo mais débil da crise. A estrutura arcaica dos velhos regimes, o domínio aristocrático e a ausência de liberdades democráticas se somaram ao desemprego e a fome, o amalgama que faltava à revolução!
Em poucos meses foram destituídos regimes enraizados à décadas e a medida que esses  desmoronavam, acentuava-se o ardor revolucionário por mudanças. Na Tunísia, país onde teve início os protestos no final de 2010, a queda de Ben Ali representou o combustível necessário a luta dos povos árabes. “Tiramos um presidente ladrão que havia roubado meio país”, exclamava-se nas ruas.
As jornadas que levaram a queda do ditador ganharam força logo após um jovem tunisiano atear fogo a si mesmo. Sem emprego, faminto e desesperado, Mohamed Bouazizi era o retrato de seu próprio povo.


A queda de Bem Ali mostrou que um novo mundo é possível! A onda das revoluções logo chegou ao Egito, na qual, depois de mais de 20 dias de intensos protestos, a revolta popular derrubou o ditador Hosni Murbarak colocando um ponto final na trajetória política do Faraó.
No entanto, quando se trata do mundo árabe, é sempre perigoso generalizar, ignorando a diversidade e as condições objetivas que envolvem cada país. Por isso, acompanhar o desenrolar dos processos no oriente médio é fundamental. No Egito de 2013, há um visível processo de avanço das forças conservadoras afinada a um tipo de bonapartismo que coloca o exército na linha de frente do governo.
Na Líbia, onde os protestos foram duramente reprimidos, houve um período de guerra civil para derrubar Kadaffi. Após meses de resistência, o ditador foi capturado e morto pela população. O povo líbio mostrou a necessidade da resistência aos velhos regimes.
O ponto de inflexão das revoluções democráticas no Oriente Médio tem como um dos eixos centrais a Síria. Bashar Al Assad segue endurecendo a repressão as mobilizações. A magnitude dos conflitos imprime uma sangrenta realidade: 2 anos de guerra civil na Síria contabilizam um saldo de mais de 100 mil mortos.
Escolas, hospitais, casas e prédios se transformam em trincheiras. Estudantes, crianças, mulheres, velhos e jovens tornam-se guerrilheiros. Os destroços de cidades como Allepo, a segunda mais populosa da Síria, revelam o cenário arrasador dos confrontos.
A foto mostra Issa, uma criança síria de 10 anos que trabalha ajudando seu pai numa fabrica de armamentos paro o Exercito revolucionário Livre da Síria.


 Há nas ruas cadáveres se decompondo. Fuzis e balas de franco-atiradores rasgam o peito de civis. Quando um companheiro morre, juram vingança. Nas palavras dos rebeldes, caiu mais um herói da revolução!
Homs. Os escombros mostram a intensidade dos conflitos.



As recentes denúncias de uso de armas químicas utilizada pelo exército pró-Assad acirraram os conflitos. A possibilidade de uma intervenção militar dos EUA reorganiza as peças do tabuleiro.
O desafio da revolução, quando a guerra já mostra grandes sinais de desgaste, é saber se localizar contra a intervenção imperialista, ao mesmo tempo em que fortalece a luta anti-regime.
Cidade de Allepo
Resta saber o fôlego nos pulmões de cada lado do conflito. Do lado de Assad estão as castas econômicas e políticas, milícias estrangeiras, parte de população próxima a burocracia, além do grupo Xiita libanês Hezbolah. Este último vem fortalecendo e impondo importantes vitórias ao velho regime. Contra as velhas estruturas há vários grupos heterogêneos que compõe o exército revolucionário. O principal é o Exército Livre da Síria (ELS). Criado em 2011 por oficiais desertores das forças armadas, seu contingente vem crescendo cada vez mais com adesão do povo sírio e com as constantes deserções do exército oficial. Segundo o próprio ELS, seus soldados totalizam mais de 40 mil guerrilheiros. Nesse cenário de forças, uma possível intervenção imperialista na Síria aumentaria os passos da contrarrevolução, pois fortaleceria os interesses ianques na geopolítica da região, além do fortalecimento de Israel e da já brutal repressão ao povo árabe da Palestina.
O conflito aumenta de complexidade, ao passo que o capitalismo não consegue encontrar respostas à crise. Do ponto de vista da organização política das forças anti-regime e anti-capitalista é fundamental acompanhar de perto o desenrolar das revoluções no mundo Árabe.

As revoluções espalharam focos de indignação por todo mundo, cabe a nós jogar gasolina!


* Coordenador geral da UES, estudante de Ciências Econômicas UFOPA e Militante do Juntos! Juventude em Luta!
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